4 de jun. de 2007

Dilema na casa dos 30


Dilema na casa dos 30


Karen fez aniversário e não se conforma que agora é uma mulher na casa dos 30. Depois da festa quase sem graça que promoveu em seu apartamento, e das risadas quase falsas que os amigos conseguiram arrancar de seu rosto, foi dormir. Caiu exausta na cama e também num poço de lembranças e nostalgia.
Lembra-se que a década passada foi ontem. Seus olhos estão fechados e o pensamento que insiste em tomar conta das conexões entre seus neurônios, formam pontes que a cada segundo levam a um torturante mesmo assunto. Sua mente, praticamente, entrou numa espécie de regressão. Vem à tona cada amor vivido, cada erro cometido.

O mais difícil neste momento, é perceber que o tempo passa, mas sua ignorante sensibilidade parece estagnada, esquece de progredir e se comporta como se descobrisse o primeiro amor a cada nova paixão que aparece em sua vida. A preocupação que assola seu interior é que seu coração não evolui conforme sua idade. Karen queria combater aquele sentimento que ela achava ridículo, mas tem consciência, aos 30 anos nada mudou! Ela jurava que essa era a idade limite para passar por isso. Até então, ela continuava em busca de um príncipe e estava completamente apaixonada.

Sente-se uma pessoa que é amor puro. É capaz de sofrer até com a melodia breguérrima sertaneja. Começa a se achar a vítima do mundo! Que triste a sua sina de chegar aos trinta sem saber se vai ter a metade da laranja tão famosa... Sua cabeça meio tonta, conseqüência de um certo exagero na vodca, fica confusa e triste por ter criado tanta expectativa de encontrar seu “pseudo-namorado” que não deu às caras em sua festa de aniversário. Nem um telefonema sequer. Ela sabia que ele não era capaz nem de mandar uma mensagem, mas adorava imaginar que tudo poderia ser diferente

As idéias mais estúpidas passavam pela sua cabeça, quanto gastou no salão fazendo aquela escova progressiva e seu amado nem se interessou em conferir como ela estava linda e radiante naquele dia tão especial. Inteligente, sabia que pensar aquilo era o cúmulo da futilidade. Muitas coisas a aproximavam de tentar descobrir realmente o que é esse estranha droga chamada paixão. A
final o que é esse sentimento que afeta Karen e mais o público feminino inteiro da torcida do Flamengo de um shopping em liquidação? Quando ela está nos braços do bofe chega a ter momentos de êxtase (algo inenarrável, muito maior do que o prazer de ver no telejornal um dia que a ciência descobriu a fórmula do chocolate que não engorda). Mas os encontros são casuais. Quando ela acorda, é sempre igual, o feitiço acaba, ele vai embora sem previsão de estar ali de novo. Talvez na próxima balada ele esteja livre, talvez não. Em dia friozinho, então, ela torcia desesperadamente pra ele aparecer no visor do seu celular, na sua rua ou na sua frente.

Por mais que se esforçasse, não entendia muito bem a frase “Que seja eterno enquanto dure” de Vinícius de Moraes. O que ela achava que era totalmente recíproco, para ele, durava apenas algumas horinhas, ou mesmo minutos, ou quem sabe, segundos... ou melhor, o equivalente à uma ejaculação. Era tudo muito contraditório! Àquela maravilhosa noite de amor com direito a juras e promessas, perdia a validade como um salpicão fora da geladeira.

Karen percebe que não poder compartilhar mais vezes de seu homem é sua maior aflição. Ficava indignada por isso. Precisar de um exemplar da raça masculina não podia ser um principal fator para desencadear sua depressão. Pôs-se a imaginar uma forma de se livrar daqueles loucos pensamentos. O que fazer para recuperar sua total sanidade mental? 
Levanta e vai pra frente do computador mandar um e-mail desaforado para o causador de sua insônia. Imagina que desabafar seria o ideal. Mal puxa a cadeira e logo desiste pois dá de cara com sua verdadeira e cruel realidade: ele nem respondeu o último enviado. Aliás, ele nunca respondeu nem uma mensagenzinha do Facebook. Sentada a beira da cama sob sua própria companhia, o abajour ilumina suas ilusões.

Começa a tentar pensar de outra forma, tem raiva de si mesma e Sente-se culpada por ter ido longe demais no seu imaginário. Aquele homem dava pistas de que não queria nada sério fazia tempo. O fato é que ela mentia pra as amigas e pra si mesma quando contava seu caso de amor. No fundo era só tesão. Ela apimentava suas lembranças. Sentia que se enquadrava mais no universo feminino quando agia assim. Foi esse o motivo que a fez se apaixonar. Estava mesmo era doente, o diagnóstico era algo como: paixonite- aguda-cultural- sem razão.

Confortava-se lembrando das sábias palavras de seu pai que dizia: “Os problemas são muito maiores quando imaginamos do que quando passamos por eles” Então apagou a luz e foi dormir com os fantasmas que não paravam de lhe assombrar. Tudo foi gradativo. Aos poucos a tortura começou a ir embora. Depois do chororô abafado, sentiu uma paz que a invadia. Tentava trabalhar sua mente de que é importante sonhar, sim, mas não se entregar a um sentimento que deseja ser dono do seu corpo.

De manhã tomou vergonha na cara e viu que uma mulher segura, não se deixa abater por nenhum motivo. Finalmente se tocou que o coração poderia não evoluir, mas a mente sim. Aos 30, uma mulher já tem vários carnavais e não seria uma paixão inventada que a derrubaria. Essa era uma das grandes vantagens das 30 velas no seu bolo. Tomou um longo banho, se olhou no espelho e viu uma pessoa diferente. Conseguia enxergar não só sua aparência. O espelho tinha o dom de fazer um raio X : ali aparecia uma mulher nua, sem maquiagem. Pronta pra vida como ela é, sem disfarces.

Estava meio paranóica. Devorou livros de autoestima e buscou no Google sobre o que acontece com o cérebro apaixonado. Tirou suas próprias conclusões: Estar cegamente apaixonada, é entrar em um estado hipnótico profundo, é uma obsessão, nada saudável, nada real. Estava desmistificado o mito... O que essa mulher sentia era a dificuldade de encontrar o amor em si mesma.

Um ano se passou e lá estava Karen abrindo as portas de seu apê para seus amigos festejarem seu aniversário de 31 anos. Era uma nova mulher. Sua risada era verdadeira e seus amigos tinham papos agradabilíssimos que lhe rendiam gargalhadas desprendidas e sinceras. Karen estava solteiríssima. No máximo, pegava uns “freelancer” da vida. Decidida e amando sua sensualidade de mulher de trinta.

Nenhum comentário: