19 de dez. de 2010

E se fosse um homem???


Hoje estive pensando no porquê do meu feminismo. São tantas lembranças de pessoas que me magoaram e me deixaram mal simplesmente por causa do machismo das pessoas que convivi e da sociedade...

Nem sempre foi comigo, mas sempre presenciei e ainda presencio episódios machistas. Eu poderia listar todos os acontecimentos marcantes na minha vida, gravo tudo, desde que me entendo por gente.

As coisas que minha mãe me falava como "verdades" sobre as mulheres, o sexismo e preconceito das pessoas.

Quando eu me separei e tinha um bebê era uma jovem que adorava festas. Meu filho devia ter uns 8 meses ou mais. Quem tem filho sabe que é normal sair menos, mas eu ainda queria e muito continuar com  minha vida de noitadas pelo menos alguns fins de semana, sem abrir mão de ser mãe.

Minha mãe não ficava com ele pra eu sair. Se ficasse, era aquela falação depois!  "Uma mulher depois que é mãe tem que abrir mão dessas coisas". Quantas vezes ou vi isso? Muitas! Mas e se eu fosse um homem? Será que o tratamento seria o mesmo? Nem vem ao caso se eu estava certa ou não em querer sair... até acho que não, viu? Hoje sou radical:  sair muito é a maior roubada na vida de qualquer pessoa. Você se torna uma pessoa vazia, alcolatra, só faz merda, so se relaciona com pessoas imbecis.

 Porém, vai entender o que me levava a procurar as noites. Eu adorava, me sentia feliz quando me maquiava, colocava um salto, uma roupa bonita e ia pra uma balada. Me sentia poderosa, apesar de hoje abominar essa vida e ver tudo isso como uma carência desenfreada. Hoje, mesmo que eu volte a ser solteira, ou por mais carente que eu esteja um dia, valorizo outras coisas na vida.

Eu era até meio viciada, quando não era mãe, queria sair quase todo dia.  Depois de ter babys, sofri com as abstinências, acho que foi isso! kkk

Após ser mãe, eu saia raramente, mas sempre ficava com aquele peso na consciência. Claro que eu saia muuuuuito menos, óbvio! Nem tempo eu tinha pra ter a mesma vida de antes. Imagine: trabalhar, estudar, ser mãe e ainda ter vida após a maternidade? kkk Era muito pra uma mulher só.

Uma vez deixei meu bebê com a mãe da ex-namorada do meu irmão, que um dia ficou com raiva dele e me chamou pra farrear. Ela sabia que eu topava, eu tava há muitos fins de semana sem sair e sem me sentir feliz verdadeiramente como mulher.

Ofereceu berço pro meu pequeno, um ombro amigo e a mãe dela como babá. Deu tudo certo, deixei meu baby, caí na gandaia. Cheguei de madrugada, ela disse que ele tinha acordado e chorado sem parar por pelo menos uma hora seguida. Me senti culpada. Foi horrível. Mas meu bebê chorava de todo jeito. Ele nunca dormiu uma noite inteira! Nunquinha! Sempre foi chorão. Até hoje! Será que eu tinha motivo pra me sentir tão culpada? A senhora que cuidou dele era um doce de pessoa.

No outro dia fui pra casa.Comentei com algumas maricotas sobre o que tinha feito. E comentei, no intuito de querer apoio... de meninas olharem e dizerem: pô, que absurdo, o ex marido não fica nunca com o bebê! Ela é jovem, tem todo direito de querer se divertir pelo menos uma vezpor mês! 

Mas o quêee????? Pelo contrárioo!!! Fui SUPER julgada. "Que fogo no rabo é esse? Deixar com uma pessoa estranha só pra sair?" ( eu conhecia a mãe da minha ex cunhada há + ou menos 2 anos, sabia que era boa pessoa). Me senti a pior das criaturas. Sofri, me senti um ET. A pior mãe do mundo.

Eu vivia dois mundo paralelos: o de mãe e o de mulher solteira, cheia de ilusões. Meu  mundo não cabia machismo, eu queria ser mãe sim, mas queria ter os mesmos direitos deles. Foi nesse dia que descobri que mulheres são tão machistas quanto os homens. O pior é quando vejo uma amiga dizer: "vôcê quis ter filhos? Agora aguente as consequencias". Como se um filho fosse feito só por uma mãe! Os homens sempre se safam dessa frase!!! 

Hoje eu sei que poderia ter escolhido o caminho do meio antes mesmo de ter filhos. Poderia ter saído menos, ter baladeado menos. Fui imatura. Nem sei o que eu buscava tanto naquele mundo de ilusão. Talvez tenha incorporado algum personagem. Vícios são uma porcaria: seja em balada, sexo, jogo, drogas, alcool.

Minha loucura por balada e falsos amigos, era grande. Mas nunca ao ponto do que minha mãe acreditava: que eu era capaz de cometer um crime de abandono, deixando meu filho sozinho para sair. Eu não faria isso! Mas a interpretação de uma mulher que não se anula após a maternidade é essa! Piranha, safada, não gosta do filho!

 Mas ela não foi a única a pensar isso. As maricotas julgavam imperdoavelmente. Enquanto isso,  se eu tivesse a chance de estar numa balada, por mais rara que fosse, eu curtia aquela vida. Um falso glamour, uma falsa independência, uma falsa liberdade, falsos amigos.  Na noite já fiz papel de muitas mulheres. De Geisy ( com vestido curto e brega) a Gloria Kalil (com roupa chic e clássica). Nunca me encontrava numa só, era uma eterna busca... mas afinal o que eu buscava tanto? Não sei até hoje, só sei que rolava flashs idênticos ao que passou na cabeça de Miss Precious, do filme "A Preciosa". Viver assim me fazia pensar que a vida poderia ser uma grande curtição, talvez isso.... mas e depois de ser mãe, ter que ser somente mãe? Enquanto o pai não precisava abrir mão de nada, pois ele não precisava ser somente pai...

Meus fins de semana, tinham um quê de um mundo paralelo. Eu olhava pra janela, pra rua... é como se me sentisse presa. Mas eu era uma ótima mãe...trabalhava, brincava, passava o dia interinho junto deles, sempre que podia. Ia a praia, fazia tudo pelo meu filho. Tudo pela felicidade dele! E era e sou feliz por ser mãe. mesmo com todas as dificuldades pra ser mulher solteira, empresária.

Eu fazia tudo pela felicidade deles.Tudo, mas sabe tudo mesmo? Olha eu aqui me justificando por ser mulher... e se eu fosse homem separado, será que eu precisava me justificar tanto? Me auto-afirmaria como um bom pai, como acabei de fazer?

O pai da cria não ficava nem por um dia. Hoje ainda se ouve falar em guarda compartilhada. Naquela época, ninguém achava nada demais no fato dele não querer ficar com o filho no fim de semana. Eu implorava. Cheguei a deixar meu filho com 1 ano na casa dele sem ele concordar. Eu so avisei que iria deixá-lo.

 Aquelas maricotas estavam certas: meu "fogo no rabo" era muito grande mesmo! Se fosse hoje, eu teria entrado na justiça pelo direito à guarda compartilhada. Mesmo que eu arrumasse babá, eu queria que esse direito fosse assegurado por lei: o direito de dividir a criação dos filhos.  O olhar de reprovação de minha mãe e de todos ao meu redor, não tinha preço.

 Eu achava muito injusto não poder dividir a criação do meu filho com o pai. Na verdade era fogo por todo canto: no rabo, no corpo, no cérebro. Eu achava injusto pelo menos não ter um fim de semana inteiro pra mim enquanto ele tinha todos. Se eu comentava isso com minha mãe ou alguma outra mulher? Nem pensar! Era óbvio que a justificativa delas era: ele é homem! Já pensaram até que era ciúme! Como assim, ciúme? A única coisa que eu queria era também poder viajar um belo fim de semana ensolarado com meus amigos com a cabeça tranquila por ter deixado meu filho em ótimas mãos!

Ele achava aquilo tão absurdo que depois desse fim de semana meio forçado, ele me entregou meu filho com  a fralda toda mijada, chorando. Como quem dizia: deixou com um homem, agora aguente as consequencias!!! Sofri. Porquê achei muita maldade com meu filho. Eu só queria poder ser feliz como mulher tambem.

Ninguém me entedia. Meu mundo caia cada dia mais. Quer saber? A balada era a única coisa que me levantava a autoestima! Acho que era isso. Eu era uma mulher recém separada de um ex marido machista, que me traiu diversas vezes, sofri o pão que o diabo amassou. Lá não existiam problemas, tudo eram luzes, dança, som, bebidas. O mundo era cintilante! Mas paradoxalmente me deixava super vazia.

Procurar apenas sexo? Nem pensar! Afinal, homem acha vulgar mulher que dá de primeira, né? Como sempre nós, as submissas, acatamos as ordens ditadas socialmente por eles e abaixamos nossa bolinha.

E se eu fosse casada, será que eu teria tantos problemas pra frequentar seja la que tipo de festa ou balada fosse com meu marido? Eu poderia deixar com babá., com sogra, ele poderia ter acordado no meio da noite e ter chorado com qualquer pessoa que fosse...  mas com certeza, o contexto seria visto como outro, portanto o julgamento seria bem diferente.... ahh tadinha, ela só quer sair com  o marido!

Minha cabeça era um labirinto em busca de respostas. Afinal o que eu queria? O que me fazia feliz finalmente? Ainda bem que sou uma metamorfose ambulante, larguei o vício, mudei, assumi quem sou, sou feliz sendo eu mesma, sem carências, sem falsos amigos! E não mudei porquê comecei a namorar. Mudei há bastante tempo. Eles ainda eram pequenos. Mudei quando comecei a ver que as pessoas são más e egoístas. Tão com você hoje bebendo e te fazendo rir, te dando um falso apoio, mas amanhã tão falando por trás, julgando.

Melhor tomar um banho de água fria, pra tirar o fogo do rabo, não é maricotas? Mas o lado bom é que me fizeram virar uma feminista fervorosa. Como diz o ditado: há males que vem para o bem! Não fosse elas e tantas outras coisas, esse blog não existiria, minha luta também não.

E eu sei, querido leitor (a) que no fundo posso mudar a vida de alguém com um simples texto. Porquê dentre muitas coisas que tenho que aguentar de todas as pessoas, simplesmente por ser como eu sou, os preconceitos e frases como: "pra quê ser assim?  Não adianta nada, é tudo bobagem, se revoltar!" há coisas mais gratificantes e que me fazem continuar. Abrir meu blog e ver os comentários de mulheres que me apoiam e estão na luta comigo. A luta por um mundo melhor, mais justo. Um trabalho de formiguinha, como diz uma colega feminista. Árduo, que transtorna tantas pessoas, me faz brigar com o mundo, parentes, maricotas, fifis, homens metidos a machões e etc.

Um dia eu recebi um comentário: " ler suas postagens me faz bem". Ninguém sabe o quanto eu fiquei emocionada, o quanto mudou meu dia pra melhor! Só eu sei! Como eu queria um ombro virtual amigo naquela época que eu estava meio "perdida". Mas nem internet tinha! kkkk Na real, a gente só se encontra se perdendo. Errando, dando a cara a tapa. Me arrependo de muitas coisas, mas fizeram parte pra hoje eu ser quem sou. Me arrependo de não ter me amado principalmente e de não ser uma pessoa segura. Hoje posso afirmar que me amo e só amo quem me ama. O resto eu respeito e quero bem. Porquê essa sou eu, uma mulher que ainda acredita na justiça.

Não posso mais listar tudo que me fez ser como sou hoje. Não caberia nessa página. Mas sou feliz por ser EU, mulher, batalhadora e mãe.

Tenho uma queda pelo budismo e acredito que nosso carma tem que ser moldado por nós. E esse é o meu! Ser uma mulher que ajuda outras mulheres, que terá uma contribuição para uma nova cultura.

Já me perguntaram o porquê do meu ativismo feminismo. Eu explico o seguinte: você já viu uma mãe ou pai que perde seu filho em acidente de trânsito e se engaja profundamente na luta de prevenção pra que outras mães não percam seus filhos? Ou uma mãe que perde seu filho de aids, como a mãe de Cazuza e abre uma ONG pró vida para cuidar de pessos com aids? então, essa sou eu, uma mulher que sofreu MUITO com o machismo de um homem e da sociedade em geral.

Se eu fizer bem a uma mulher que seja, meu propósito já está sendo cumprido. Porquê ninguém, mas ninguém mesmo merece ser infeliz, seja lá quais forem suas escolhas. Ainda mais quando algo nos aflige por sermos mulheres... e sempre que isso acontece, eu desperto meu senso de justiça e pergunto: "e se fosse um homem?"

É com essa pergunta, vamos conquistar a verdadeira emancipação. Porquê de nada adiantam as leis! A gente não quer só Maria da Penha, a gente quer comida, diversão, balé. A gente quer inteiro e não pela metade! Um amigo brinca dizendo "vocês já votam, dirigem já andam sozinhas, querem mais o que?" Eu respondo, quero muito mais! Mais que uma mulher na presidência, mais que leis. Quero uma nova cultura. Quero menos ignorância.

Pra quê lei de proteção a mulher que nem funciona, se seu vizinho é um babaca que cria o filho ensinando que meninos são assim e meninas são assado? E você vira ao seu redor e seus parentes, amigos, professores, todo mundo cria esse apertheid do que menina pode e deve ser e o que menino não pode e não deve ser??? E aquelas pessoas que dizem que menina tem a natureza quieta e meninos inquietos? Como se instintos humanos fossem caracteristicas de gêneros e não da espécie! É senso comum demais pra uma pessoa incomum como eu!

Lá pra próxima remessa de queima de sutiãs, quem sabe alguma coisa mude. Ainda leva mais uns cem anos!