Quem viu a novela ontem? Pra variar, show de machismo. O "pretendente de
Valdirene" , que a deixou no motel sozinha, só por misoginia mesmo, estava tentando se desculpar pra ela. Pra isso, ele jogou a outra na fogueira,
disse que a enfermeira era a maior " piriguete" do hospital. Não era
crítica do autor, é isso que me deixa irritada. Era reforço do machismo nosso de cada dia, mesmo. Mulher que sai com mais de um cara é puta. Homem pode deixar mulher no
motel sozinha, tirar onda da cara dela, humilhar, chamá-la de vadia... na
novela é assim, homem pode tudo, mulher não.
Walcyr, anda fazendo jus ao sobrenome, anda sendo bem Carrasco, mesmo. Já rolou papo de relógio biológico e reforço de estereótipo de vadia, é quase todo dia. Ele reforça bem a ideia de mulheres se odiarem. Essa influência social, funciona bem. No Facebook, o que não faltam, são menininas novinhas ou mais velhas, xingando umas as outras, mandando indireta. Coisas que raramente se vê no comportamento masculino. Esses dias deu no noticiário: uma adolescente matou outra, por motivo banal. Você pode me achar paranoica ( pense bem antes de achar isso, pois essa opinião é meio padronizada, ou seja, não é sua, você apenas reproduz), mas eu atribuo sim, a essa rivalidade e competição que somos ensinadas.
Em Saramandaia, pelo menos, um dos vilões, o personagem Carlito ( Marcos Pasquim), é o machistão. Menos mal. De frente pro mocinho traído e a mulher que mantinha relacionamento com os dois, ele disse: " Você é corno, ela não pode receber uns tapinhas que se arreganha toda". O mocinho saiu transtornado, mas a atitude de não fazer nada com a mulher que o traiu, apenas não querer mais vê-la, foi digna. Quando o homem trai, ninguém deseja a morte dele, apenas que a mulher se separe dele. Quando é a mulher que trai, todos querem apedrejá-la em praça pública.
A mulher que trai, tentou explicar ao traído; disse que o outro mantinha uma força sobre ela, que ela não controlava. (Famoso tesão). Porém, depois de um cara nojento como ele, jogar as intimidades deles assim, no ventilador, o tesão deve diminuir, né? Espero que sim. Cenas como essa, demonstram que a liberdade sexual, definitivamente não é um direito feminino. Fico imaginando a dificuldade dos atores em fazer esses papeis, se eles não são machistas, na vida real. Para Caio Castro, já é bem mais fácil, repetir a palavra " vadia", como fez várias vezes, xingando a personagem Patrícia, falando sozinho. É que dia desses, ele disse em uma entrevista que uma fã era vadia, por ter transado com ela e depois postados fotos dele na cama. Sim, ele pode transar, sentir desejo. Ela é vadia. (Ora, se ele é famoso, que não se deite com mulheres anônimas, pois está sujeito). Isso mesmo, ainda vivemos essa época. Caio não fez nem 30 anos e é esse cara conservador e coxinha. Lamentável.
Para mim, fica claro que o machismo é naturalizado nos folhetins, por ser natural na vida de muitos atores e autores. A pessoa escreve a história baseada na vida, no que se vê. E o que a gente vê, no mundo, é um bando de ser humano do tipo papagaio. Aqueles que não questionam, reproduzem falas.
Gosto de novela e não vou deixar de assistir. Sou brasileira e quero ter direito de dar pitaco no que a mídia nos diz. Não curto posar de intelectualizada, por não assistir novela. Só vou saber parte da cultura do meu país, se eu vê-las, a Globo tem poder. Por isso, fica aqui meu protesto a quem se acha superior, por não assistir. As vezes, a trama não mudaria nada, se o autor mudasse algumas falas. É totalmente possível, usar as novelas pra combater o machismo ( ou pelo menos não reforçá-lo), mas ninguém fala sobre isso, afinal, reza a lenda, que machismo não existe mais. Claro, na cabeça dessas pessoas, o homem pode por que é o maior detentor de testosteronas ( anham, ainda existe a ideia de que quanto mais o tal hormônio, mais desejo)... a mulher nasceu pra ser o bicho emocional, o homem o sexual e bla bla bla...
Quando eu digo que todo machismo cultural, vem dessa ideia de biologia. Está arraigado em nossa criação. Nosso cérebro é condicionado a não aceitar outras ideias. Desde que estamos na barriga, sofremos todo sexismo, toda diferença, não poderia ser diferente.
O problema das mulheres serem coniventes com o machismo, é que não é tão fácil desconstruir tudo que aprendemos sobre felicidade. E o machismo, enganosamente, é como se fizesse parte desse universo feliz, do que é ser mulher. A sociedade diz que ser mulher multi-tarefa é uma maravilha. Que preservar a vagina, é o melhor que podemos fazer para nos valorizarmos. Que odiar outras mulheres, é legal, pois nos dá soberania e poder.
Lembre-se que ser mulher é uma construção social. No reino animal, as macacas gozam igualmente. Não tem essa de emoção pra um gênero e " ser visual" para outro. E somos animais. Racionais. Infelizmente o estímulo da racionalidade é maior nas fêmeas humanas. Os homens acham que seus instintos são incontroláveis e por isso, podem transar e gozar sem culpa.
Um dia, vi o ator José Loretto, refletindo no programa Amor & Sexo, sobre as teorias ( que muitos consideram absurdas) da psicanalista Regina Navarro. Ela dizia que conto de fadas são machistas. A maioria dos atores acharam um exagero. Flavia Alessandra, revoltou-se. Já Loretto, abriu a cabeça e começou a debater. Achei interessante a forma como ele estava disposto a receber novas informações. Ele não parecia um homem papagaio. Não discordou e nem concordou, apenas disse que via sentido em alguns argumentos da especialista. O ator me deu uma pontinha de esperança, pois se existissem mais Lorettos e menos Caios Castros e Carrascos, a sociedade e a arte noveleira, no nosso país, seria bem mais interessante.